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O que fica na gaveta

Miguel Lucas

O que fica na gaveta

Miguel Lucas

Joana

A Joana é colega da Eva e foi no seu telemóvel que a vi pela primeira vez, deslizando no écran. Deve ter sido há pelo menos cinco anos. Ela é muito bonita. Pele clara, cabelos cor de mel, sempre com um sorriso nos lábios e nos olhos. A Eva já me tinha falado desta sua nova colega e eu já andava curioso. Pessoalmente só estive com ela duas ou três vezes, se é que se pôde considerar estar com ela, pois foi em ocasiões muito pontuais, sempre inibido de a interpelar convenientemente.

Ao longo do tempo, mesmo sem estar com ela, fui ficando a conhecê-la por meio do que a Eva me ia contando. Elas dão-se bastante bem e a Eva tem muita simpatia por ela, o que também me contagiou. Fiquei a saber como ela é mimada, carinhosa, carente, despreocupada e muitas outras características suas. Fiquei a gostar muito dela. Fiquei também a saber um pouco sobre a sua vida sentimental. Que as suas relações não são muito duradouras. E que nos períodos intermédios sofre um pouco. Num destes períodos a Eva queixou-se de que a Joana andava insuportável, carente e com falta de homem... E vai-me contando estas coisas ingenuamente, pensando, não sei porquê, que eu fico indiferente. Como ela se engana...

Uma vez, quando tive que me deslocar em trabalho às Ilhas Baleares, a Joana soube-o e pediu-me, através da Eva, que lhe trouxesse umas menorquinas, que são umas sandálias típicas daquelas ilhas. Quando lá estava, foi com prazer que lhe dediquei aquele tempo, procurando as que melhor se assemelhassem às das fotos que recebi. Senti um enorme prazer em atender este seu pedido, saboreando cada momento que gastei a procurá-las e imaginando como lhe iam ficar nos seus delicados pezinhos. E foi com alguma facilidade que encontrei o par que preenchia os requisitos.

Quando estava a acondicioná-las na mala para me ir embora cometi o erro de pegar nelas e dar-lhes um beijo como se os seus pés estivesse a beijar. Digo erro porque não tenho a certeza de que os objetos não transportem consigo qualquer coisa das pessoas que os retiveram. Algo meu ficou naquelas sandálias e talvez a Joana as associe a mim quando as calça. Na verdade, sinto que eu não lhe sou indiferente, não sei explicar porquê. Comecei a sentir haver uma certa ligação entre nós. Uma certa intimidade. Aquela sensação de que se me encontrasse a sós com ela poderia retirar a máscara e falar com ela com a cumplicidade de dois velhos amigos.

De vez em quando torno a vê-la desfilar no telemóvel da Eva. Na praia, em biquíni, em festas com os amigos. Sempre sorridente e linda. Como suspiro por dentro nestas ocasiões... A Joana é a mulher que para mim melhor concilia os dois tipos de atractividade. O seu corpo atrai-me tanto como a sua alma. Geralmente isto não me acontece. Tenho tendência para amores platónicos, no sentido em que, nesses casos, o sexo nem me passa pela cabeça. É um prazer menor comparado com o de partilhar o momento com a pessoa amada. Mas com a Joana é diferente. Não consigo dissociar as duas coisas e uma parece ser a consumação da outra. É muito diferente do que sinto por outras mulheres em que apenas a atração física está presente. Nestes casos, assim que me afasto delas, afasta-se também delas o meu pensamento.

No caso da Joana, apesar do afastamento, a sua presença afirma-se muitas vezes. A Eva, sem o saber, vai deitando achas na fogueira. Ainda há dias, no pingo do verão, e a propósito do calor que fazia, saiu-se com o comentário de que a Joana confessou no trabalho que, estando agora sozinha, para suportar o calor dorme toda nua... Como pode um homem ficar indiferente a descrições como esta? A que delírios pode conduzir a imaginação fértil de um homem como eu... Estes deslizes só fazem com que o meu desejo pela Joana vá crescendo cada vez mais. Felizmente não têm surgido oportunidades de me encontrar com ela, pois tenho a certeza de que não conseguiria resistir a tentar seduzi-la.

O melhor remédio é seguir o ditado: longe da vista longe do coração. Tento mantê-la o mais afastada possível dos meus pensamentos. Nunca aderi ao Instagram e a Joana é a principal responsável por isso. Não conseguiria suportar vê-la e ficar quieto. Não sou masoquista. Mas por vezes dá-me tanta vontade...

 

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Nota:

Os nomes aqui citados apenas são verdadeiros nas histórias que são fictícias.

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