A senhora da mesa em frente
No sábado passado, quando estava a jantar com a minha filha no Centro Comercial, e os meus pais ao lado (com quem nos encontrámos casualmente), reparei na senhora que estava na mesa à minha frente. Não me pareceu ser mais nova do que eu (daí a ter designado, propositadamente, por senhora), no entanto, achei-a tão atraente como se fosse uma jovem. Fez-me lembrar a Valerie Leon, atriz por quem nutro certa paixão, a par da Lily James e da Imogen Poots... O cabelo, castanho, ondulado e relativamente curto, não era pintado, mas se tinha brancos, dali não os conseguia ver. Tinha um sinalzinho maroto ao lado do nariz, uns lábios com um desenho maravilhoso e uns olhos azuis celestiais. Estava num grupo grande. Talvez num encontro familiar, apesar de não haver crianças. Via-se pelo à-vontade que tinham uns com os outros. Não sei se era alta, se baixa, se era magra ou gorda. Sei que me atraía intensamente. Estava vestida de forma casual, até muito caseira. Reparei que não tinha aliança... Não deixava de ir olhando para ela de vez em quando. Pelo menos de início, pois os intervalos de privação cada vez iam ficando mais reduzidos.
Eu estava triste. A carpir a mágoa de não ter visto a Catarina. Triste por confirmar que ela me anda a evitar. E, no entanto, ali estava eu a deslumbrar-me com outra mulher. Senti que estava a trair. Sobretudo a Catarina. Não é isto bizarro?
Talvez para compensar a minha frustração, decidi ser mais descarado ao olhar para a minha recente atração. A dada altura, e não podia ser de outra maneira, ela reparou em mim. Primeiro os seus olhos passaram pelos meus distraidamente, como um carro que passa lentamente por nós numa rua, mas, ao ter reparado na atenção que lhe estava a prestar, vi-a perfeitamente a parar e a fazer marcha atrás para se certificar se o que estava a acontecer seria mesmo o que estava a supor. Vi-a franzir as sobrancelhas e a arregalar os olhos revelando uma certa perplexidade. Não sei se a incredulidade dela se prendeu com o facto de estar a ser galanteada, o que duvido, porque com a sua beleza ainda deve haver muitos homens a fazê-lo, se foi pelo meu atrevimento, se foi por me achar um puto ou, pior, um puto atrevido. O certo é que ela travou a fundo e ficou a olhar para mim, com aqueles olhos azuis encantadores, como se me estivesse a atirar com os máximos, sem desviar o olhar. E eu, deslumbrado com aquela visão, como que em êxtase, não tirei os olhos dos seus. Aquele momento, que pareceu durar minutos, só terminou por sua decisão. Foi magnético! Foi eletrizante! Claro que, ao mesmo tempo, com sérias dificuldades, ia mantendo a conversa que estava a ter à mesa. Segundos depois procurei-a novamente e ela já estava à minha espera. Repetimos a dose, só que desta vez fui eu quem desviou o olhar...
Nesta altura a minha mãe estava especialmente conversadora e não consegui voltar a olhar para ela durante algum tempo. Quando tentei novamente já não me procurava. Nem voltou a procurar. Arrependi-me por não me ter mantido firme naquela segunda vez. Por ter dado sinais de fraqueza. Mas acho que o fiz sobretudo para simular certo desdém. Um erro de cálculo que acabou por me sair caro. E que, pior que tudo, deitou por terra toda a magia que tinha acontecido anteriormente. Alvitro outras razões para o seu desinteresse. Todas elas bastante possíveis e válidas, mas tão humilhantes que me vou furtar de as enumerar. Trata-se de uma mulher, sem dúvida, inteligente!
Já em casa fui eu quem fez marcha atrás. Recuei até ao momento do primeiro embate para focar a minha memória naquela emoção, esforçando-me por esquecer o que se passou depois. Ainda suspirei, mas, ciente do desfecho, já não encontrei o mesmo sabor. No domingo tudo voltou ao mesmo. Em todos os lugares já andava a ver se via a Catarina e já pouco me lembrava desta bela senhora.